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Como o impacto social está presente nos modelos de negócios, pesquisas acadêmicas e movimentos da sociedade civil organizada

Doadores priorizam auto satisfação ao escolher causas para apoiar, diz estudo

31/07/2023

Levantar recursos para ajudar causas de impacto social não é uma tarefa fácil: é preciso muita estratégia de convencimento, além, é claro, de informações claras e transparentes sobre a causa que se pretende ajudar. Mas, há ainda um detalhe que passa despercebido e que tem um peso significativo na decisão dos doadores, podendo influenciar o volume de arrecadações que uma causa recebe. Esse detalhe está ligado à forma como são divulgadas as despesas gerais da organização por trás da ação. 

Foi isso que mostrou a pesquisa “Evitando a aversão às despesas gerais na caridade”, desenvolvida pelos pesquisadores da Universidade da Califórnia, Ayelet Gneezy, Elizabeth Keenan e Uri Gneezy. Eles se baseiam em outros estudos já produzidos nesse campo, como o de Charity Navigator e CharityWatch, que atribuíram classificações a instituições de caridade com base em seus gastos com despesas gerais. Evidências desses estudos mostraram que esses custos internos das organizações podem orientar as decisões de doação, de modo que gastos gerais mais altos diminuem as doações. 

Em seu trabalho, os pesquisadores da Universidade da Califórnia ainda trouxeram os prejuízos desse comportamento social. Eles afirmam que, diante dessa aversão, as instituições se sentem pressionadas a diminuir seus custos internos, o que pode gerar um impacto negativo justamente em sua capacidade de realizar campanhas de arrecadação de fundos ou, ainda, de atrair talentos para trabalhar em seus projetos. 

“A pressão dos doadores sobre as instituições de caridade para reduzir os custos indiretos e de arrecadação de fundos leva a várias outras consequências negativas, como subnotificação desses custos por instituições de caridade e uma tendência de financiar apenas programas com custos indiretos baixos”, destacam os pesquisadores. Diante desses impactos negativos, eles propõem alguns experimentos para entender melhor a intensidade dessa aversão e os motivos, a fim de se pensar em alternativas para as organizações filantrópicas.

Pesquisa testa doadores

Para entender esse comportamento dos doadores, os pesquisadores tentaram responder a perguntas, como: por que as pessoas estão preocupadas com qual porcentagem de sua doação irá para as despesas gerais? E por que são tão avessas a pagar custos indiretos? Segundo eles, há duas respostas mais comuns a essas perguntas que estão relacionadas a dois pensamentos: “a organização filantrópica é ineficiente” e “altas despesas gerais podem sugerir corrupção dentro da instituição de caridade”. 

Mas, a pesquisa da Universidade da Califórnia propôs um terceiro motivo: os doadores querem que seu dinheiro tenha um impacto direto na causa que eles apoiam. Nesse sentido, há uma relação com a satisfação própria do doador que se sente melhor ao pensar que o dinheiro que ele doou colocou comida na mesa de uma criança ou pagou por um remédio que vai curar uma pessoa. Para eles, isso é bem mais atrativo ou satisfatório do que pensar que sua doação pagou os custos de hotel do CEO da organização em uma viagem de relacionamento, por exemplo.

A partir desse entendimento, os pesquisadores fizeram um experimento em parceria com uma grande fundação de educação nos Estados Unidos. A experiência consistiu em enviar uma carta de solicitação de doação a 40 mil pessoas que doaram para causas semelhantes nos 5 anos anteriores. As pessoas foram convidadas a contribuírem com US$ 20, US$ 50 ou US$ 100. Os doadores foram divididos em 4 grupos diferentes, sendo que cada grupo recebeu um tipo de mensagem. O grupo controle apenas foi convidado a participar da doação de uma nova iniciativa da fundação, sem mais detalhes. 

O grupo chamado de “inicial” recebeu o mesmo convite, mas com a informação de que a fundação já havia garantido US$ 10 mil para o projeto de um doador privado. O grupo chamado de “equivalente” foi informado de que a fundação já havia garantido US$ 10 mil para o projeto de um doador privado que seria usado como subsídio equivalente. Trata-se de um modelo em que, a cada dólar doado pelas pessoas em geral, esse doador também repassa US$1, de maneira que o valor total da doação recebida pela organização (doador privado e pessoas no geral) pudesse chegar a US$20 mil.

Por fim, o quarto grupo chamado “despesas gerais” recebeu a informação que a fundação já havia garantido US$ 10 mil para o projeto de um doador privado e que esse montante seria usado ​​para cobrir todos os custos gerais. Assim, cada dólar arrecadado iria diretamente para o programa. Entre os resultados colhidos pelos pesquisadores algo ficou claro: a informação de que os recursos para despesas gerais já estavam garantidos, incentivou a doação para a causa em questão.

Segundo o levantamento, ao todo, 336 indivíduos do grupo controle doaram. Este número aumentou para 475 no grupo inicial. Já no grupo equivalente o número de doadores foi de 441, enquanto que no grupo despesas gerais chegou a 855, o que representa uma taxa muito superior a qualquer um dos outros grupos. 

O estudo também avaliou os valores doados. O levantamento mostrou que o maior número de pessoas que doaram US$100 estavam no grupo despesas gerais: foram 43 ao todo. No grupo controle foram 3 e nos grupos inicial e equivalente foram 27 em cada.

Driblando a aversão

Diante desses resultados, os pesquisadores propõem uma estratégia no levantamento de recursos nas organizações de impacto social que é justamente captar uma doação inicial como um incentivo para maximizar as contribuições de outros doadores em potencial.

“Imagine que, como responsável pelo desenvolvimento de um hospital, você está diante de um grande doador que está prestes a doar US$ 5 milhões para sua instituição. Você pode dizer ao doador como o dinheiro será usado – em um novo prédio ou em algumas máquinas de última geração. Como alternativa, você pode tentar convencer o doador a usar a doação para cobrir os custos indiretos de arrecadar dinheiro para o desenvolvimento do hospital. Essa conversa pode permitir que o hospital ofereça uma campanha livre para os doadores menores, os quais se preocupam se estão doando diretamente para a causa. Nossa pesquisa sugere que essa abordagem – usando a doação como um incentivo na forma de doações livres para doadores menores – pode ajudar a aumentar o número de doações e o valor total da doação”, explica Uri Gneezy, em artigo recentemente publicado na revista digital, Behavioral Scientist

 

Texto por: Thaíne Belissa

 

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