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Como o impacto social está presente nos modelos de negócios, pesquisas acadêmicas e movimentos da sociedade civil organizada

Além do storytelling: marcas precisam rever comunicação do ESG se quiserem gerar conexão

23/11/2023

Vivemos a era da responsabilidade social, mas também a da desconfiança. O consumidor está mesmo mais consciente, o que o torna também mais crítico e até incrédulo. O Global Trustworthiness Monitor 2023 mostra que  6 a cada 10 brasileiros acreditam que as marcas usam a linguagem de propósito social sem se comprometerem com as mudanças reais. Já o Gartner menciona um cinismo do consumidor em relação às ações de ESG nas empresas.

O problema, aparentemente, não está na falta de engajamento do consumidor. A pesquisa Impacto ESG no Varejo, realizada em 2023 pelo Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV), mostra que mais da metade dos entrevistados se dizem dispostos a pagar de 5% a 20% a mais por produtos ou serviços atrelados a ações efetivas em ESG. Pesquisas do Gatner apontam que em três a cinco anos, 78% dos líderes da cadeia de suprimentos vão comprar apenas produtos fabricados, embalados, entregues e descartados de forma socialmente e ambientalmente responsável.

Então, se o consumidor se importa com responsabilidade social a ponto de pagar mais por produtos sustentáveis, de onde vem o cinismo? Na publicação “Resposta Rápida: como gerar confiança na sustentabilidade com clientes”, de 2022, os pesquisadores do Gartner afirmam que a má comunicação das empresas sobre suas ações de ESG está no cerne dessa desconfiança. Segundo eles, há um gap entre o que as empresas gostariam de comunicar sobre suas práticas sustentáveis e aquilo que os consumidores realmente entendem. O estudo afirma que as comunicações das empresas falham por serem técnicas demais, pouco atrativas e pouco credíveis

O  estudo Dissonâncias do ESG com a sociedade civil, realizado pela Llorente y Cuenca (LLYC), também aponta a falha na comunicação das ações de impacto social. A pesquisa mostrou que algumas das informações mais relevantes de ESG aparecem de forma diluída nas seções dos sites das companhias, em áreas segmentadas para stakeholders e de difícil acesso. Já uma pesquisa realizada pelo Google em parceria com o Sistema B e a MindMiners, mostrou que os conceitos do ESG são importantes para 87% dos brasileiros, mas apenas 20% da população sabe o que a sigla significa.

Para a especialista em estratégia criativa e professora convidada da Fundação Dom Cabral, Erlana Castro, há muitos desafios que dificultam a comunicação assertiva das práticas de ESG. Um deles é o esvaziamento de alguns termos, utilizados excessivamente e de forma pouco autêntica em comunicações institucionais, como “ecológico”, “verde”, e “sustentável”. A ideia de que “não se deve gabar das boas ações realizadas” também é uma questão cultural que pode impedir a comunicação das ações de responsabilidade social.

“Há, ainda, uma questão que é: o ESG nasce de uma conversa corporativa, da turma do compliance com sabor de gestão de risco. E esse é um sabor meio travado, careta, difícil de compreender, com palavras difíceis do juridiquês. Esse conteúdo, que é praticamente um catálogo, não se conecta emocionalmente conosco. Então, o mundo corporativo terá que descobrir uma nova linguagem para comunicar ESG”, afirma.

Muito além do storytelling

Erlana admite que esse não é um desafio simples. Falar sobre os problemas sociais e ambientais é difícil porque, a princípio, são temas que queremos negar e esquecer porque nos incomodam. Além do mais, criar um conteúdo que gere conexão com consumidores com valores tão diversos pode ser uma longa caminhada sobre ovos. 

A professora lembra, entretanto, que é preciso começar de algum lugar e que comunicar ESG é mais sobre ponto de partida do que ponto de chegada. “As empresas precisam achar o que eu chamo de mínima verdade viável. Que verdade nos une? Temos que começar a costurar a comunicação do ESG por ela, encontrar um ponto de partida comum à marca e aos consumidores”, afirma. 

Para ela, as marcas estão muito preocupadas com o final da história, em mostrar um storytelling bonito, mas a verdade é que as complexidades em torno do tema do ESG nos colocam em lugar de vulnerabilidade e faria mais sentido as marcas reconhecerem que ainda estão contando essa história, inclusive junto com os stakeholders. “Não é mais sobre storytelling, mas sobre history making”, diz.

Caminhos da comunicação criativa

Embora não haja uma receita de bolo sobre como comunicar ESG de maneira assertiva, a professora traz alguns caminhos. Ao analisar os trabalhos que receberam o Grand Prix no Cannes Lions, maior festival de criatividade e publicidade do mundo, ela trouxe alguns insights:

Criativismo

O criativismo é a junção de criatividade e ativismo. Para a professora, as marcas precisam encontrar seu lugar de ativismo e propor ações concretas. Uma boa pergunta para começar a pensar no assunto é: o que pulsa como urgência para a marca e para a sociedade?

Engenharia de ideias

A ideia de comunicação ganha uma complexidade maior num contexto criativo transformado pela tecnologia. Para Erlana, mais que um insight brilhante, as empresas terão que ter a competência da articulação criativa. Elas terão que solucionar problemas concretos, por meio de uma engenharia de ideias.

Ações afirmativas

A especialista  alerta sobre a necessidade de se repensar o conceito de campanhas publicitárias com início, meio e fim. Para ela, esse é um conceito ultrapassado e, agora, as marcas precisam se posicionar em ações criativas afirmativas com continuidade.


Texto: Thaíne Belissa

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