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Como o impacto social está presente nos modelos de negócios, pesquisas acadêmicas e movimentos da sociedade civil organizada

Pesquisa mostra que classe social influencia na cultura de doação

05/07/2023

Por Thaíne Belissa

O ato de doar não parece muito complexo: alguém tira uma parte do que tem para ajudar outra pessoa que precisa. Mas, a forma como se doa e, consequentemente, a cultura de doação pode ser muito diferente, dependendo das motivações e do lugar de onde vem esse doador. 

É o que demonstra a pesquisa “Classe Social e Alocação de Doações no Brasil”, realizada entre 2017 e 2021, na Fundação Getulio Vargas. O estudo premiado internacionalmente é do pesquisador e doutor pela FGV, Yan Vieites, que se dedica ao estudo da psicologia do consumidor, com ênfase nas consequências comportamentais da pobreza.

A pesquisa realizou uma série de experimentos com uma parcela representativa da população do Rio de Janeiro, propondo um convite à doação. Em um deles, os pesquisadores convidaram as pessoas a participarem de uma pesquisa em troca de uma gratificação de R$ 10. Logo depois, elas eram informadas que tinham a opção de fazer uma doação para dois tipos de causas: uma de combate à fome e outra de incentivo a iniciativas culturais. Elas também tinham a opção de não doar.

O resultado da pesquisa mostra que, de todos os participantes, 60% decidiu doar e o valor médio da doação foi de R$ 4,96. Mas, o grande contraste se deu na comparação entre as classes sociais dos doadores. No Compelxo da Maré, a adesão foi maior: 86% dos participantes fizeram alguma doação. Já na  Zona Sul esse número foi de 43%. 

Além disso, a escolha da causa social também foi distinta. No Compelxo da Maré, o valor médio da doação foi de R$ 5,57, sendo que R$ 3,74 foram destinados à causa associada à fome e R$ 1,83 a ações culturais. Já na  Zona Sul essa lógica se inverteu: o valor médio de doação foi de R$ 4,30, sendo R$ 1,28 para alimentos e R$ 3,02 para iniciativas culturais.

Entre as conclusões dos autores está a relação entre escassez/abundância de recursos e simpatia em relação a uma necessidade urgente e básica, como por exemplo o acesso ao alimento. A pesquisa lembra que “as experiências pessoais moldam as respostas afetivas e comportamentais ao sofrimento dos outros”.

“Devido às diferenças na escassez vivida e, consequentemente, na simpatia em relação às necessidades básicas não atendidas das pessoas, levantamos a hipótese de que, ao alocar valores de doação entre causas urgentes e não urgentes, os consumidores de classe baixa doarão mais recursos para o urgente”, afirmam os pesquisadores no levantamento.

Eles também comentam que a preferência pelas doações às causas culturais entre os mais ricos pode estar associada à busca por uma promoção de imagem no seu próprio círculo, uma vez que causas como educação e cultura costumam ser bem vistas por seus pares.

A pesquisa também traz uma aplicação para essa conclusão em sinal de alerta: “este fenômeno representa um fardo desproporcional para aqueles que têm menos para dar, o que, por sua vez, pode ajudar a perpetuar as desigualdades econômicas”, afirmam os pesquisadores. 

Por outro lado, a mesma pesquisa mostra que esse contraste entre as classes sociais diminui um pouco quando o convite à doação é combinado a um apelo emocional sobre as causas urgentes. Segundo a pesquisa, um conteúdo com carga afetiva pode melhorar as respostas emocionais e o comportamento dos doadores, uma brecha interessante e que pode ser explorada. 

“Demonstramos que essa estratégia pode influenciar não apenas o valor que as pessoas estão dispostas a doar, mas também as causas sociais para as quais estão mais dispostas a contribuir”, afirmam

 

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